O aparecimento da pandemia pelo COVID-19 colocou um alerta para todos os países, uns mais, outros menos graves, mas todos igualmente preocupantes.
A exigência da quarentena, medida de importância crucial para diminuir a velocidade do contágio, pode se constituir um desafio para as mulheres, em especial aquelas que vivem em situação de vulnerabilidade e violência.
Para evitar uma catástrofe no sistema de saúde, colocam-se muitos desafios para todas as pessoas, a maioria deles agravados pela sociabilidade capitalista que, diante da crise estrutural do capital, impõe uma pressão sobre o estado e, este busca garantir a sua reprodução, ainda que isso possa colocar em risco a vida de milhares, senão milhões de pessoas.
À cada dia mais pessoas são contaminadas, o número de pessoas com a doença, só no Brasil, chegou a 30.425, com 1.924 óbitos (6,3% de letalidade), conforme dados de 16/04/2020.
Em meio às notícias do avanço da doença no país, assistimos o presidente da República, em uma atitude irresponsável, sair às ruas, como o fez antes, desafiando as orientações do seu próprio ministro da saúde de que devemos manter o isolamento social.
Neste momento em que a nação deve manter-se informada e segura, em que a maioria dos governadores, prefeitos fazendo esforços para conter o vírus e que os profissionais da saúde colocando suas vidas em risco para atender a população, a comunidade científica trabalhando incessantemente para descobrir o remédio, assistimos a uma elite atrasada, seguindo os desmandos do chefe da nação, saindo às ruas para pedir a volta ao trabalho.
Há que se perguntar: A volta de quem? Dos trabalhadores e trabalhadoras que terão que enfrentar o transporte coletivo, ariscando-se a contaminar-se e, na volta, contaminar sua família. Claro, que os/as patrões/as continuarão em casa, ou se forem para suas empresas o farão em seus próprios carros, ou nos seus jatinhos, onde os riscos são menores. Mas não se enganem, ainda assim, correm riscos.
A quarentena é necessária, para diminuir a velocidade dos contágios por meio do contato entre os infectados e os não infectados. Portanto, mais do que necessária, é vital, manter a quarentena nos moldes propostos – só liberar serviços essenciais.
Estamos vivendo momentos cruciais para a vida da nação, mas ainda para a vida das mulheres, pois a necessidade da quarentena e o fechamento das escolas, creches e outros equipamentos, fazendo com que permaneçam em casa, muitas destas mulheres – também os homens da classe que vive do trabalho – vão para a casa, correndo o risco de serem demitidas, como já está acontecendo com trabalhadores/as de empresas terceirizadas que prestam serviço para a FIESP.
Empresas que prestam serviços à FIESP – Federação das Industrias do Estado de São Paulo, informam que a entidade reduziu o valor dos contratos com 40 empresas e 800 trabalhadores perderão o empego. São empresários dando sua contribuição!
As mulheres enfrentam momentos desafiadores. Aquelas que ainda continuam no mercado de trabalho e trazem o trabalho para casa, devem, além de dar conta do trabalho da empresa, também cuidar dos filhos, da casa. Contudo, a casa, para muitas delas, significa perigo. Há muitas mulheres em quarentena que vivem um momento ainda mais assustador, pois passam a conviver com o medo da violência doméstica.
A quarentena para milhares de mulheres significa o aprofundamento das desigualdades e, ainda pior, o aumento da violência a que estão expostas. No Rio de Janeiro, segundo o Plantão Judiciário da Justiça do Rio de Janeiro houve um aumento da ordem de 50% nos registros dos casos de violência doméstica por causa do confinamento.
Segundo o órgão, a maioria das pessoas que acionaram o órgão era de mulheres que sofreram alguma agressão em casa. A casa deveria ser o espaço do recolhimento e do cuidado, contudo, a casa pode ser também o lugar mais inseguro para mulheres e crianças em situação de violência. O isolamento social pode agravar essa situação, pois ela – mulher e crianças – passam a conviver 24 horas com o/a agressor/a.
A ONU Mulheres publicou um documento sobre relações de gênero para orientar os governos da América Latina na determinação das ações sobre o corona vírus. A ONU afirma que as mulheres continuam sendo as mais afetadas pelo trabalho não remunerado, principalmente em tempos de crise.
O documento também recomenda que os serviços para atendimento às mulheres em situação de violência devem ser mantidos, pois em um contexto de crise, os riscos de violência doméstica contra mulheres e crianças são maiores.
Para Silvia Chakian, Promotora de Justiça do MP-SP e membro do GEVID (Grupo de Atuação Especial de Enfrentamento à Violência Doméstica), “a dimensão de gênero da pandemia é real. Com a redução do convívio social e a aproximação com o agressor, a tendência é que mais conflitos aconteçam”. Segundo ela, essas mulheres, vítimas de violência doméstica, representam em torno de 70% da demanda do plantão.
Estamos diante de um momento muito difícil e, mais ainda para as mulheres que vivem relações abusivas no interior de suas casas, mas elas precisam de apoio para resistir, mas para isto precisam contar com a proteção do Estado e dos Centros de Atenção a vítimas de violência doméstica.
Bastante interessante algumas iniciativas de pessoas que, nos condomínios, deixam bilhetes oferecendo ajuda para mulheres que neste momento de isolamento social sofrem violência. Contudo, infelizmente, essas iniciativas são pontuais, não dão conta de um universo maior.
Precisariam ser envidadas ações mais abrangentes, como por exemplo, a Patrulha Maria da Penha, um serviço de proteção à mulher: “Trata-se de um trabalho conjunto da Guarda Civil Municipal, Polícia Civil, Polícia Militar, Delegacia da Mulher, Secretaria dos Direitos e Políticas para Mulheres e Núcleo de Atendimento de Violência Doméstica, que podem ser acionados a qualquer momento no caso de agressão familiar. Segundo informe da Secretaria da Mulher, esse patrulhamento é feito pela guarda municipal com perfil para este atendimento, os quais são acionados pelo número 153.
Estas e outras iniciativas que possam fazer frente à violência doméstica são necessárias, entre estas está o Projeto de Renda Básica de Cidadania Emergencial, aprovado no dia 30, pelo Senado, que garante o pagamento no valor de R$ 600, 00 a trabalhadores/as informais.
Oxalá a sociedade como um todo, seja mais solidária, em especial para com os mais pobres e com as mulheres, para que, depois de passar esta tempestade, possamos cantar, dançar e nos abraçarmos nas ruas e nas praças de todo país.
*Artigo escrito por Onilda Alves do Carmo, Doutora em Serviço Social e Professora do Departamento de Serviço Social da UNESP – Câmpus de Franca.
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