O Hospital Allan Kardec de Franca passará por uma reformulação na área de atendimento em saúde mental e, dentro de 90 dias, encerrará as internações em seus leitos psiquiátricos.
A notificação desta decisão, recomendada pelo Ministério Público Estadual devido ao déficit operacional imposto pelo subfinanciamento público, foi feita pela Fundação Espírita Allan Kardec, mantenedora do hospital, nesta sexta-feira, 25, aos gestores da Rede Pública de Saúde.
“Após décadas de subfinanciamento e infrutíferas negociações no sentido de reformulação dos valores recebidos pela Fundação, não nos restou outra opção: no prazo de 90 dias, serão encerradas as internações no Hospital Allan Kardec”, lamentou o presidente da Fundação Allan Kardec, Mario Arias Martinez.
“Neste prazo, os órgãos responsáveis pelas internações psiquiátricas deverão buscar novos prestadores de serviço e novos locais para que se realizem as internações. Muito provavelmente, esses locais serão hospitais gerais, como preconiza a reforma psiquiátrica que vem há duas décadas tentando eliminar os leitos em hospitais psiquiátricos”, completou.
O Hospital Allan Kardec mantém 122 leitos SUS para internação de pacientes psiquiátricos de Franca e região, sendo que 60% deles são da própria cidade. Por eles, passam aproximadamente 500 pessoas. Desse total, cerca de 40 pacientes vivem na Fundação, porque não têm ou foram abandonados por suas famílias.
O futuro desses moradores remanescentes do hospital devem ser as Residências Terapêuticas. Em reunião com a presidência da Fundação nessa quinta-feira, 24, o prefeito Alexandre Ferreira informou que instalará cinco novas unidades na cidade.
Déficit operacional
Ao longo de seus 100 anos de história, a Fundação Allan Kardec tem desprendido de seu próprio patrimônio para minorar o déficit operacional causado pelo subfinanciamento público para a prestação de serviços médico-hospitalares especializados em saúde mental destinados à população usuária do SUS.
Em 2015, com o agravamento da situação econômico-financeira, que poderia levar a Fundação à falência caso continuasse a comprometer seu patrimônio, o Ministério Público Federal propôs um acordo, em que Município, Estado e União se comprometeram a reajustar para R$ 102,60 a diária por internação psiquiátrica do SUS.
É esse mesmo valor que hoje os entes públicos continuam a repassar ao Allan Kardec, desconsiderando a inflação do período e a nova realidade – imposta, principalmente, pela pandemia do coronavírus – sete anos depois.
A estimativa é de que a diária esteja em R$ 233,00, atualmente. A diferença entre o que investe para atender um paciente e o que recebe do SUS projeta um déficit de R$ 2,7 milhões à Fundação apenas neste ano. Montante que passaria para R$ 5,7 milhões em 2023.
Diante da situação financeira alarmante e das inúmeras tentativas infrutíferas de reajustar a tarifa repassada pelo SUS, não restou à Fundação outra alternativa senão o encerramento dos leitos de internação psiquiátrica para que continue prestando o atendimento aos pacientes da rede pública nos demais equipamentos e serviços na área de saúde mental.
A Prefeitura de Franca se prontificou a complementar parte dos valores da diária, dentro dos limites jurídicos e orçamentários possíveis. “Porém, sem o auxílio dos demais órgãos financiadores – Estado e União -, mesmo com o complemento proposto, não há viabilidade econômica para a continuidade da prestação dos serviços”, ponderou o presidente Mario Arias.
A decisão tem anuência da 12ª Promotoria de Justiça de Franca, cujo titular, Murilo César Lemos Jorge, é curador da Fundação. Ciente da “situação de desiquilíbrio econômico-financeiro e sob risco de falência no curto prazo”, o promotor de Justiça recomendou ao hospital “que encerre os serviços deficitários de leitos para internações psiquiátricos”.
O futuro
“O objetivo deste movimento, que de certa forma é traumático, é preservar o patrimônio e a integridade financeira da Fundação Espírita Allan Kardec”, observou o vice-presidente da entidade, Fernando Palermo, reforçando que a instituição não deixará o trabalho de filantropia em relação à saúde mental. Ao contrário, o objetivo é aumentar o número de pessoas com transtornos mentais atendidas pela Fundação.
A entidade atende hoje 30 pacientes de saúde mental no Hospital Dia SUS e outras 60 pessoas no programa de Desenvolvimento Humano, que são as Oficinas Inspiração – um projeto de geração de trabalho e renda destinada a pacientes egressos de outros serviços de saúde mental.
Como parte do que preconiza a reforma psiquiátrica, dentro da RAPS (Rede de Atenção Psicossocial), a Fundação Allan Kardec administra os dois CAPSs (Centros de Atenção Psicossocial) de Franca, responsáveis por 300 atendimentos diários, em média, e 7,6 mil procedimentos por mês.
Além de manter os atendimentos já oferecidos, ampliando o número de pessoas assistidas, a Fundação pretende assumir novos serviços dentro da RAPS, como Ambulatório de Saúde Mental, Unidade de Urgência/Emergência Psiquiátrica, CAPS e Hospital Dia, em Franca e cidades da região. Tudo isso, claro, mediante, viabilidade técnica e econômica.
“Então, de acordo com o propósito do senhor José Marques Garcia, fundador há 100 anos da Fundação Espírita Allan Kardec, de acolher esses nossos irmãos necessitados de auxílio, vamos continuar e crescer nossos serviços, prestando ainda mais um bom trabalho para a sociedade como um todo”, concluiu Fernando.
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